STYX - Circling from Above
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PRIMEIRAS IMPRESSÕES
Nunca fui próximo da veterana STYX. Conheço as músicas clássicas meio que por osmose – “Come Sail Away” aqui, “Renegade” ali – mas a banda, para mim, era mais lenda do que presença. Talvez exatamente por isso “Circling from Above”, seu décimo oitavo disco de estúdio lançado pela gravadora HIP-O RECORDS (com distribuição pela Universal Music), tenha me atingido com tanta força: sem a âncora da nostalgia, pude escutar com o ouvido livre e, assim, reconhecer um dos trabalhos mais encantadores, criativos e sinceros do rock progressivo contemporâneo. Aqui não há esforço para reviver glórias passadas, mas sim um ato contínuo de reinvenção – elegante, maduro e profundamente humano.
O disco se abre com a faixa-título, “Circling from Above”, uma vinheta interessantíssima que, em pouco menos de dois minutos, já entrega uma ambiência cinematográfica. É uma espécie de prólogo cósmico que evoca a vastidão do céu e a introspecção de quem o observa. Os sintetizadores de Lawrence Gowan brilham com tons etéreos, enquanto a guitarra de Tommy Shaw se insinua timidamente com frases líricas à la Gilmour. É uma introdução breve, mas que estabelece com clareza o espírito do álbum: olhar de cima, mas com os pés no chão.
Sem transição abrupta, mergulhamos em “Build and Destroy”, uma das peças mais energéticas do disco. O riff inicial é instantaneamente pegajoso, os teclados vintage remetem aos anos 70 sem parecer datados, e o refrão, com suas camadas vocais empilhadas, reafirma o DNA da STYX. Mas há aqui uma tensão moderna: as letras falam de construção e ruína em tempos de inteligência artificial e solidão conectada. O solo de guitarra, com emoção envolvente, é um dos pontos altos da faixa – Shaw ainda sabe fazer sua Les Paul cantar com alma.
“Michigan” desacelera o ritmo, mas aumenta a densidade emocional. Tommy Shaw assume os vocais principais com uma entrega melancólica que se apoia em harmonias beatlemaníacas. O arranjo cresce aos poucos, com percussão contida e teclados que rememoram o mellotron em seu auge.
Na sequência, “King of Love” traz James “JY” Young de volta ao microfone. Com uma abordagem quase falada, seu timbre grave se contrapõe aos arranjos saltitantes que evocam QUEEN, ELECTRIC LIGHT ORCHESTRA e até um toque de ZAPPA. A faixa se constrói como um teatro musical glam, com solo de guitarra desvairado, backing vocals quase caricatos e... uma gaita! Sim, e ela funciona incrivelmente bem. O baixo de Terry Gowan aqui é um destaque silencioso, preenchendo com elegância os espaços entre os excentricismos.
“It’s Clear” começa como uma balada sintética – suave, introspectiva, quase ambient – até ser puxada para o centro do palco por harmonias vocais brilhantemente construídas. Gowan conduz os versos com delicadeza, e Shaw o responde no refrão com vigor melódico. Há aqui um toque country disfarçado, como se A STYX cruzasse o deserto de Morricone em um trem de “vocoders”. O final, com seu clima western, é inesperado e delicioso.
A próxima faixa, “Forgive”, é pura contenção emocional. Começa com piano e violão em um dueto lírico que se sustenta sobre um silêncio tenso. As harmonias vocais são sussurradas, a bateria de Todd Sucherman entra como uma respiração – sutil, porém presente. A composição não estoura em nenhum momento, mas se resolve em um fade-out de beleza serena. É o tipo de faixa que parece pequena à primeira audição, mas se torna gigante ao ser ouvida com atenção.
“Everybody Raise a Glass” quebra a melancolia com uma explosão de teatralidade pop. É um número cabaré, com batidas marcadas, vocais que flertam com o exagero, e um refrão que parece saído diretamente de um musical da Broadway. O solo, com timbres à la Brian May, confere um toque majestoso ao que poderia ser apenas um pastiche. O resultado é cativante e charmosamente excêntrico.
“Blue Eyed Raven” é, provavelmente, o momento mais cinematográfico do disco. A introdução com sons de carroça e violino estabelece o clima folk-fantástico, enquanto Shaw narra, com voz suave, a lenda de uma mulher enigmática. A guitarra flamenca encontra o fiddle em um duelo alegre, quase dançante. É uma canção que parece ter saído de um conto de fadas celta reimaginado para o século XXI. A construção rítmica é envolvente, e a produção, riquíssima em texturas. Uma faixa ousada, que funciona muito bem na construção quase etérea do disco.
Em seguida, “She Knows” traz Will Evankovich aos vocais, com um timbre rouco e expressivo que evoca Roger Daltrey. O arranjo é um verdadeiro passeio: clarinete no meio da faixa, viradas de bateria inspiradas, vocais em estéreo que brincam com a espacialidade. A canção tem alma beatle e coração progressivo. O solo de guitarra é breve, mas elegante. Evankovich, aqui, se mostra não apenas um membro adicional, mas parte integral do novo fôlego criativo da banda.
“Ease Your Mind” é uma vinheta de 45 segundos que parece uma pausa para respiro. Atmosférica e encantadora, ela antecipa com suavidade o que vem a seguir: “The Things That You Said”, uma das joias ocultas do álbum. Combinando camadas vocais em estilo ELO, sintetizadores giratórios e uma levada constante de baixo e bateria, a faixa se constrói como um caleidoscópio sonoro. O refrão é memorável, e o trabalho de Terry Gowan e Todd Sucherman brilha intensamente. Sem dúvidas, um dos momentos mais grandiosos de todo o trabalho.
“We Lost the Wheel Again” é puro rock’n’roll à moda antiga. O riff remete a Billy Squier e Ron Wood, enquanto os vocais de Evankovich disparam como Daltrey em sua fase mais esfuziante. É uma faixa que foge completamente do cânone tradicional da STYX – e talvez por isso funcione tão bem. Há espaço para solos, improvisos e diversão. O baixo, novamente, é um espetáculo à parte.
Por fim, “Only You Can Decide” encerra o disco com suavidade e sabedoria. A música é uma balada acústica de pegada introspectiva, com vocais partilhados entre Shaw e Gowan. A melodia é simples, mas tocante, e os arranjos de cordas conferem um toque emocional que fecha o álbum com a maturidade que ele merece. A última frase ecoa como um sussurro filosófico: a decisão, afinal, é sempre nossa.
VEREDITO
“Circling from Above” não é um disco de retorno, nem de comemoração. É uma afirmação. A veterana STYX, mesmo com mais de 50 anos de estrada, não quer apenas reviver glórias. Quer criar, experimentar e se emocionar – e esse álbum é prova disso. Ao evitar as armadilhas da nostalgia e mergulhar em uma sonoridade que equilibra o clássico e o contemporâneo, a banda entrega um dos trabalhos mais interessantes de sua longa trajetória.
Para quem nunca teve a STYX na playlist, como eu, “Circling from Above” é uma porta de entrada digna, instigante e profunda. Para os fãs veteranos, é mais um capítulo de orgulho em uma história que insiste em continuar sendo escrita – com dignidade, paixão e harmonia.
Em 2025, a STYX não apenas ainda voa. Ele voa alto. E com propósito. Se tua praia é aquele rock clássico, que retumbou nos anos 60 e 70, este disco é mais que obrigatório, é essencial!
9.0/10
(Daniel Aghehost)
TRACK LIST
1 Circling From Above
2 Build and Destroy
3 Michigan
4 King of Love
5 It’s Clear
6 Forgive
7 Everyone Raise A Glass
8 Blue Eyed Raven
9 She Knows
10 Ease Your Mind
11 The Things That You Said
12 We Lost the Wheel Again
13 Only You Can Decide